Habermas e Krugman analisam a crise europeia e democracia

Parte da matéria “Um continente à deriva” de Antonio Luiz M. C. Costa, da Carta Capital

Posicionamento ainda mais sintomático e muito mais surpreendente vem da própria Alemanha, da pena do maior paladino vivo do Iluminismo europeu: Jürgen Habermas, filósofo da razão comunicativa e do diálogo democrático. Para ele, o acordo Merkel-Sarkozy lançou a Europa numa era pós-democrática: “Querem estender o federalismo do Tratado de Lisboa em uma gestão intergovernamental pelo Conselho Europeu. Tal regime possibilitará transferir os imperativos dos mercados aos orçamentos nacionais sem legitimação adequada, usando ameaças e pressões para obrigar parlamentos esvaziados de poder a pôr em vigor acordos informais e sem transparência. Os chefes de governo transformarão o projeto europeu no seu oposto. A primeira democracia transnacional se tornará em um arranjo para exercer uma espécie de governo pós–democrático, parti-cularmente eficaz por ser disfarçado”.

Em entrevista ao jornalista Georg Diez, de Der Spiegel, Habermas foi ainda mais contundente: “Um pouco depois de 2008, entendi que o processo de expansão, integração e democratização não progride automaticamente por necessidade interna, é reversível. Pela primeira vez na história da União Europeia, experimentamos de fato um desmantelamento da democracia. Eu não pensava que isso fosse possível. Se o projeto europeu falhar, quanto tempo levará para voltar ao status quo? Lembre-se da Revolução Alemã de 1848 (a ‘Primavera dos Povos’): quando fracassou, precisamos de cem anos para recuperar o mesmo grau de democracia de antes”.

Do outro lado do Atlântico, também o economista Paul Krugman vê EUA e Europa em depressão que, mesmo se ainda não é tão grave quanto a dos anos 1930, já ameaça a democracia. Populismos de direita como o dos “Verdadeiros Finlandeses” e do Partido da Liberdade austríaco disputam o poder com partidos tradicionais e, na Hungria, o partido direitista Fidesz, já no poder com ampla maioria parlamentar, está emendando a Constituição para controlar a mídia e o Judiciário, colocar o principal partido de esquerda (ex-comunista) na ilegalidade e se apoderar irreversivelmente do poder.

Na Itália, esse populismo de direita é representado pela Liga Norte, que se recusou a apoiar o governo “tecnocrático” de Mario Monti e agora defende que o Norte da Itália se separe tanto do resto do país quanto da Zona do Euro, recriando a lira.  E o primeiro-ministro mostra pouca habilidade ao tentar impor aos italianos uma improvável “revolução no modo de pensar”, que equivale a transformá-los em alemães da noite para o dia. Nem a extrema-esquerda -conseguiria ser tão utópica.

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