Bresser-Pereira, FHC e a privatização da saúde

Ex-Ministro do MARE Luiz Carlos Bresser-Pereira

Luiz Carlos Bresser-Pereira sempre disse que sua Reforma Administrativa proposta no Governo FHC, quando ele era Ministro da Reforma do Aparelho do Estado, não foi neoliberal.

Perry Anderson (Balanço do Neoliberalismo) informa que o neoliberalismo nasceu após a segunda guerra mundial, com Friedrich Hayek (O Caminho da Servidão), que desde então reuniu os inimigos do Estado do bem-estar social europeu e do New Deal estadunidense. Com a crise econômica dos anos 70 e os Governos Thatcher e Reagan no início dos anos 80 o neoliberalismo começou a ganhar espaço, com seus ideais contrários a igualdade, aos sindicatos e ao movimento operário em geral e dos gastos sociais do Estado e, consequentemente, dos impostos. para o neoliberalismo o Estado deve ser forte apenas para romper o poder dos sindicatos e manter o grande capital, o mercado, mas parco nas intervenções econômicas e sociais. Sobre o tema recomendo VIOLIN, Tarso Cabral. Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise crítica (Fórum, 2ª ed., 2010).

Se neoliberalismo é o movimento contrário ao Estado do Bem-Estar Social, que se fortaleceu no Brasil com os governos de Collor e FHC, e uma das características foi a diminuição do tamanho do Estado, com privatizações, entendo que sim, a reforma de Bresser/FHC foi neoliberal.

Fernando Henrique Cardoso

Uma das grandes  bandeiras da reforma neoliberal-gerencial brasileira foi a figura das Organizações Sociais  – OSs. Entidades privadas sem fins lucrativos (Terceiro Setor), qualificadas pelo Estado, que assumiriam serviços sociais como educação e saúde. Bresser chamou, a época, de publicização, mas na verdade o repasse de serviços sociais para as OSs nada mais é do que privatização.

Eis que no último domingo foi publicado na Folha de S. Paulo artigo de Bresser criticando as privatizações por meio de PPPs, quando serão repassadas para entidades privadas a responsabilidade pela construção e gestão de hospitais e escolas públicas, que eu também critico e, inclusive, entendo ser inconstitucional (Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise critica).

Das duas uma: ou se arrependeu e verificou que foi um erro sua política neoliberal, ou até hoje tenta se enganar acreditando  no caráter social de sua reforma, pois a década de 90 foi negra para o Brasil no quesito estruturação e organização do Estado e da Administração Pública.

Pelo menos o ex-Ministro está certo em sua crítica às PPPs na saúde!

Veja o artigo de Luiz Carlos Bresser-Pereira do último domingo dia 16 na Folha de S. Paulo:


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA

Privatização da saúde

 


Na saúde, o mercado não é bom alocador de recursos porque não garante a qualidade dos serviços



NOS ANOS 1990, enquanto a Argentina e o Chile faziam reformas neoliberais radicais, que os países ricos que as aconselhavam não tinham disposição para fazer, o Brasil parecia constituir-se em exceção. E de fato o foi ao não privatizar a Petrobras ou o Banco do Brasil.
Entretanto, em uma área o Brasil cedeu. Nessa década permitiu a transformação das instituições de ensino superior sem fins lucrativos em empresas. Havia aí um grave desrespeito à lei -como é possível que uma instituição que não tem proprietários pode, de repente, ser apropriada por aqueles que a controlam de fato? E havia uma contradição com os princípios da Reforma Gerencial do Estado de 1995 que defendia a transformação dos serviços sociais e científicos apoiados pelo Estado em organizações sociais -entidades públicas não estatais com contrato de gestão com o Estado- ao mesmo tempo em que condenava a entrega do ensino superior a empresas.
Desde então o processo de privatização do ensino superior vai de vento em popa, enquanto nos países ricos esta solução continua a se constituir em um despropósito.
Agora é a vez da privatização dos serviços de saúde. O grande homem público que foi Mario Covas criou em São Paulo com enorme êxito as organizações sociais de saúde, entregando sua administração a entidades sem fins lucrativos -públicas não estatais.
Nesta semana, leio uma reportagem no Valor (10.jan) informando que quatro Estados (Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais e São Paulo) se dispõem a lançar neste ano Parcerias Público-Privadas (PPPs) na área da saúde. Quem está avançado no projeto é o Rio de Janeiro. PPPs para construção e para gestão de hospitais.
Se se tratasse simplesmente de PPPs para construção não haveria problema. O Estado pode entender que a construção do hospital pode ser feita pelo setor privado com subsídio do Estado para depois ser alugado a uma organização social por ele patrocinada. Pelo que leio, entretanto, também a gestão está incluída no negócio.
Por que objetar contra a transformação de hospitais subsidiados pelo Estado em empresas? Porque na saúde, como na educação, o mercado não é um bom alocador de recursos. Principalmente, não garante a qualidade que os serviços de educação e de saúde devem ter.
Porque os seus usuários -alunos ou pacientes e suas famílias- não têm as informações necessárias para que o mercado possa funcionar bem. A assimetria de informações é gritante.
E porque o serviço mal feito nessas duas áreas é algo muito mais grave do que um mal serviço de limpeza, ou de digitação de dados.
Com as PPPs na saúde, informa-nos o consultor de empresas que está assessorando o processo de privatização, os governos estaduais buscam “uma nova fonte de financiamento para a saúde, melhores resultados, e a possibilidade de estarem atualizados com a tecnologia”. Maravilha! O lucro privado tem sempre “razões” incríveis a seu favor. Muitas vezes boas razões.
Mas, neste caso, razões contra a cidadania. Razões que são consistentes com o exemplo dos Estados Unidos, não o da Europa, onde os serviços de saúde não foram privatizados, são mais eficientes, e de melhor qualidade.

2 comentários sobre “Bresser-Pereira, FHC e a privatização da saúde

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