Será que Dilma sabe que seu Ministro privatiza inconstitucionalmente contra o PT, PDT e OAB?

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Presidenta Dilma Rousseff (PT), Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação Marco Antonio Raupp e o Ministro da Educação Aloizio Mercadante (PT)

O governo da presidenta Dilma Rousseff (PT) criou nesta quinta-feira (14) o Plano Inova Empresa, que prevê investimentos de R$ 32,9 bilhões para impulsionar a produtividade e a competitividade da economia brasileira por meio da inovação tecnológica. Até aqui tenho apenas elogios. Uma das funções do Estado é intervir e fomentar a economia.

O problema é que por influência do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e do Ministério da Educação (MEC), o governo federal também anunciou a criação da Empresa Brasileira para Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), que visa fomentar o processo de cooperação entre empresas nacionais, principalmente pequenas e médias, e instituições tecnológicas ou instituições privadas sem fins lucrativos voltadas a pesquisa e desenvolvimento (P&D). Terá investimentos previstos de R$ 1 bilhão para 2013 e 2014, com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e outros parceiros.

O grande erro é que a Embrapii será uma organização social (OS).

As OS foram criadas no governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) para a privatização dos serviços sociais como educação, saúde, cultura, pesquisa, etc., com o intuito de burlar as licitações, os concursos públicos e os controles em geral. A ideia era repassar para ONGs, para entidades do Terceiro Setor, a gestão de entidades estatais sociais. Mas por pressão de juristas progressistas e da sociedade, o próprio FHC privatizou via OS apenas cinco entidades.

Em 1988 a OAB, o PT e o PDT entraram com duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIns) contra a Lei 9.637/98. Pode ser que ainda em 2013 o STF julgue a lei como inconstitucional, caso siga o voto do Ministro relator Carlos Ayres Britto, agora aposentado.

 O principal defensor do modelo de privatização em tela é o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp (veja os slides que ele apresentou), que é Ministro por indicação do Ministro da Educação, Aloizio Mercadante (PT).

Raupp diz que a nova organização é inspirada nos moldes da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que atua no agronegócio. Mas a Emprapa é uma empresa pública, uma empresa estatal que faz parte da Administração Pública indireta, uma entidade que faz concurso público, licitação e é controlada pelo Tribunal de Contas da União. Enfim, respeita o regime jurídico-administrativo.

Outra referência para a criação da Embrapii foi a organização alemã Sociedade Fraunhofer. Como se modelos alienígenas se encaixassem automaticamente no ordenamento jurídico brasileiro.

Embrapii contará com a participação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), do Instituto Nacional de Tecnologia (INT/MCTI), do Rio de Janeiro; do Instituto de Pesquisa Tecnológica (IPT), de São Paulo; e do Centro Integrado de Manufatura e Tecnologia (Cimatec); e do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). Ou seja, é a iniciativa privada lidando com milhões de reais, sem a necessidade de respeitar o regime jurídico -administrativo.

Veja a parte do discurso de Dilma sobre a Emprapii:

“Em segundo lugar, eu quero falar da Emprapii. Eu acho que a Emprapii é um dos locais do casamento, viu Robson, é um dos locais do casamento entre o setor público e o setor privado. Acho a Embrapii, a gente tem de olhar a questão da Embrapa, que foi uma grande e muito bem sucedida iniciativa do nosso país, mas eu acho que a Embrapii, ela terá uma outra característica, ela terá um diferencial. Ela precisa desta relação estreita entre empresa e órgãos do governo responsáveis pela inovação. Ela precisa da integração com os órgãos de pesquisa, os laboratórios. Ela precisa de uma relação muito mais, eu diria, híbrida do que foi a Embrapa.

Por isso, eu tenho certeza, essa Embrapa da indústria, que é a Embrapii, ela terá um papel fundamental. Ela vai ser um local de articulação das nossas relações. E isso eu acho que fará muita diferença, fará muita diferença para todos nós.” Veja o discurso completo da presidenta, clique aqui. Ouça o discurso completo, clique aqui.

O PT, atual partido da presidenta, e o PDT, ex-partido de Dilma, questionam a constitucionalidade das OS, junto com a Ordem dos Advogados do Brasil. O prefeito atual de São Paulo, Fernando Haddad (PT), se nega a utilizar o modelo das OS na cidade na área da saúde. Já que o Tribunal de Contas de São Paulo decidiu que a privatização via OS é mais cara e menos eficiente. O prefeito de Curitiba, Gustavo Fruet (PDT), vem questionando o modelo das OS de Curitiba chamada ICI – Instituto Curitiba de Informática, por ser uma caixa-preta que lida com milhões de reais de forma nada transparente. O ex-presidente Lula não privatizou nada via OS em seu governo.

Veja um pouco mais sobre o tema no meu livro Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise crítica (Fórum, 2ª ed., 2010), que é a minha Dissertação de Mestrado em Direito do Estado pela UFPR: Uma análise crítica do ideário do “Terceiro Setor” no contexto neoliberal e as Parcerias entre a Administração Pública e Sociedade Civil Organizada no Brasil, e ainda o texto Estado, Ordem Social e Privatização – as terceirizações ilícitas da Administração Pública por meio das Organizações Sociais, OSCIPs e demais entidades do “terceiro setor”.

Presidenta Dilma: seus Ministros e assessores informaram detalhadamente sobre as OS? Recomendo que o modelo de privatização via OS seja descartado. Por que não criar uma empresa pública ou uma fundação estatal para exercer as funções pretendidas pela Embrapii. Seu governo já tem essa tendência na área da saúde. O discurso anti-privatização do PT pode cair por terra em 2014.

TARSO CABRAL VIOLIN – autor do Blog do Tarso, é professor de Direito Administrativo e estudioso sobre o Direito do Terceiro Setor