Por Daigo Asuka
Sim, é isso mesmo que você leu: empresas correm diversos riscos ao usarem uma solução proprietária. Reflita: investir no licenciamento, implantação e treinamento de um determinado programa e algum tempo depois, descobrir que a empresa não existe mais.
Exagero? Recentemente tivemos uma nova crise mundial e centenas de empresas fecharam as portas.
Conhece o caso da Be Incorporated? Tratava-se de uma empresa que foi criada para desenvolver um sistema operacional, o BeOS, especifico para trabalhar com Multimídia. E para torna-lo ainda mais robusto, foi criado um computador com hardware especifico para ele, que ficou conhecido como: BeBox. Ou seja: um ex-funcionário da Apple tentou reproduzir seu bem sucedido modelo de negócios.
Era realmente bom? O BeOS tinha sistema de arquivos de 64 bits, suporte a journaling (isso em 98). Como era voltado a um único tipo de máquina, foi mais fácil melhorar a performance para trabalhar com áudio e vídeo digital, além de animações e gráficos. Eu mesmo nunca mexi, ou mesmo vi um desses pessoalmente, mesmo que conseguisse uma cópia do sistema, o Virtual Box não tem opção para roda-lo.
O mundo estava preparado para ele? A pergunta certa é: o bolso das pessoas estava preparado para comprar tanto sistema operacional quanto o computador exclusivo? Não! Tanto que pouco tempo depois, o BeOs foi portado para funcionar em diversas outras plataformas, começando pelo Mac, depois PowerPc e Intel e a BeBox descontinuada.
Em 2001, a Palm comprou a propriedade intelectual do sistema e encerrou seu desenvolvimento, deixando órfãos dezenas (centenas?) de usuários que decidiram investir no BeOs. E agora? Quem vai criar e disponibilizar correções para falhas de segurança? Comprou uma licença para plataforma Intel? Como conseguir suporte para periféricos mais recentes? E a tecnologias mais recentes, como os compressores de vídeo Matroska e 3GP? Nesse caso em especifico, poucos dias depois de a PALM anunciar o fim do sistema, um grupo de voluntários começou a criar o Open BeOs, uma continuação/atualização do sistema original. Não vou prolongar ainda mais o exemplo do BeOs, há diversas matérias e mesmo uma página na Wikipédia falando em detalhes sobre o assunto.
Imagine você empresário, que investiu na compra de uma determinada solução, depois de anos de trabalho, treinando funcionários, alimentando o banco de dados, entre outros, em uma bela manhã, abre um site de noticias, ou mesmo a página da software-house e descobre que por algum motivo, o sistema está sendo descontinuado e a empresa faliu ou foi comprada.
Mas um software livre, independente de ter sido criado por uma empresa ou por 1 ou mais programadores independentes também pode ser abandonado ou não receber atualizações oficiais. Sim, pode mesmo! Então há prejuízo igual? O código-fonte está disponível para quem quiser alterar, seja contribuindo oficialmente ou mesmo criando uma nova versão. Se o sistema é bom, a chance dele ser continuado, mesmo que não oficialmente, é grande. Um bom exemplo disso é o editor web NVU, criado pela Linspire, foi o primeiro editor WYSIWYG em software livre. A última versão é de 2005. Então web designers que quiserem trabalhar apenas no Linux são obrigados a usar essa ferramenta defasada? Existe uma continuação não oficial chamada Kompozer que apesar de também não ser das mais completas, supera a versão original, cuja empresa criadora foi vendida e boa parte de seus produtos foram descontinuados.
Tenho acompanhado as criticas da Assespro (Associação das Empresas de Tecnologia da Informação) nacional e estaduais com relação ao fato do governo tanto federal, quanto dos estados do Paraná, Rio Grande do Sul e outros, pela sua opção pelo software livre, com exceção de quando não há alternativas, afirmando que o governo deveria deixar a parte de automação para as empresas de soluções proprietárias, reclamam do fato de o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados) ter exclusividade para desenvolvimento de projetos para o governo.
Relembrando o que aconteceu com o BeOS, pergunto: qual a garantia de que essas empresas estarão sempre ‘vivas’? Você, que paga seus impostos (ignorando os ‘detalhes’), iria gostar de saber que o governo, depois de muito tempo investindo numa solução proprietária para informatizar todos os órgãos, vai ter que gastar ‘outro tanto’ para trocar tudo o que tinha feito, porque quem criava o sistema até então usado fechou as portas? Não existe lei no Brasil (acho que no mundo) que obrigue uma empresa a liberar o código-fonte de seus programas porque está falindo, sendo vendida (e o comprador vai descontinuar alguns ou todos produtos), ou mesmo decidiu que não é interessante continuar desenvolvendo-o.
Assim como os diretores da Assespro, discordo que apenas o Serpro e demais órgãos do governo devam ter exclusividade para desenvolver os softwares por ele utilizado, pois como aconteceu recentemente, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) rompeu contrato com o Serpro, que por 3 anos não consegui desenvolver e implantar um sistema de administração de processos (SUAP/JT – http://www.baguete.com.br/noticias/software/14/04/2010/tst-rompe-contrato-com-serpro), mas optar pelo código-fonte fechado pode gerar prejuízos iguais ou maiores, além do gasto desnecessário com licenças, que bem sabemos, não é de meros 6% do gasto total com implantação.
Em dezembro de 2009, foi disponibilizada a solução de automação e-cidade, no Portal do Software Público Brasileiro, uma segura opção para prefeituras tanto informatizar-se (que bem sabemos, muitas prefeitura ainda trabalham usando papel e caneta, tendo alguns computadores antigos abandonados em algum depósito por serem considerados lentos, por não conseguir rodar versões mais recentes do sistema operacional proprietário), quanto migrar para software livre e economizar com licenças.
Mas é claro que a Assespro partiu para o ataque (ad-holerite), exigindo que o Ministério Público deve investigar ‘o caso’ (mais detalhes em: http://www.magmidia.com/projects/tecinfo/30/mag.html – página 38).
Existem diversas empresas nacionais que desenvolvem soluções para automação de prefeituras que obviamente sentiram-se prejudicadas com o lançamento do e-cidade. Pergunto mais uma vez: qual a garantia de que elas (as empresas) nunca terão problemas e seus produtos terão continuidade, mesmo que por outra pessoa e/ou empresa? Aliás, as soluções dessas empresas são multiplataforma, ou o governo também será obrigado a comprar licença de banco de dados e de sistema operacional?

Um comentário sobre “Software proprietário: perigoso para empresas”