Privatização das Escolas no Paraná

Por Tarso Cabral Violin

Ontem foi sancionada a Lei Estadual 22.006/2024 no Estado do Paraná, que privatiza várias escolas estaduais.

A nossa Constituição de 1988 é Social, Republicana e Democrática de Direito e, assim, proíbe qualquer fascismo ou neoliberalismo.

Entretanto, desde os anos 90, em alguns momentos, o Supremo Tribunal Federal, que é o principal guardião da Constituição, ao mesmo tempo que barrou o fascismo, aceitou “pitadas” de neoliberalismo no Brasil.

Entretanto, na área social, como educação, saúde e cultura, o STF permitiu apenas o neoliberalismo em determinas situações, como a possibilidade de que entidades do Terceiro Setor assumam a gestão de algumas estruturas estatais.

Mas isso não é o ultraneoliberalismo apregoado por alguns nos dias atuais. Não é possível constitucionalmente que escolas públicas sejam privatizadas. Em especial, mesmo se isso fosse possível, o STF poderia permitir essa privatização em situações menos radicais e apenas para entidades privadas sem fins lucrativos, e não para empresas do mercado com fins lucrativos, como faz a Lei 22.006/2024.

E, mesmo se fosse possível a privatização em tela, isso seria feito por meio de licitação, para a escolha das empresas, processo que não é citado na Lei estadual aprovada ontem, o que também é uma inconstitucionalidade.

Também não é possível a privatização ou a terceirização de atividades fim das escolas públicas. Tudo relacionado à educação nas escolas deve ser efetivado pelo Estado, por agentes públicos, e não por empresas que visam lucro e interesses privados.

Não é constitucional, assim, que com a desculpa de que a privatização das escolas vai “desonerar a responsabilidade administrativa e financeira”, ao mesmo tempo se repasse para empresas privadas com fins lucrativos o estabelecimento de metas e critérios pedagógicos, como faz a Lei 22.006/2024. Isso fere a autonomia pedagógica das escolas e fere o princípio do concurso público.

Toda a atividade fim de uma escola pública deve ser efetivada por agentes públicos ou escolhidos de forma democrática ou concursados.

Outra inconstitucionalidade da Lei 22.006/2024 é a não aplicação da privatização para determinadas escolas públicas, como por exemplo para as da PM, de ilhas, etc. Isso fere o princípio da isonomia, da universalização e o da motivação, pois não há aparentemente justificativa para essa exclusão. Ou a privatização é boa e constitucional para todas as escolas, ou não. Faltou, portanto, a justificativa dessa exclusão na exposição de motivos e no debate.

Por fim, e não menos importante, pelo contrário, o art. 206, inc. VI, da Constituição, obriga a gestão democrática do ensino público. A gestão dentro de uma empresa privada com fins lucrativos nunca será totalmente democrática. As empresas do mercado podem demitir seus trabalhadores sem justa causa, seus dirigentes são escolhidos com o interesse principal do aumento do lucro, não há eleição para a escolha de dirigentes, não há concurso público para a escolha dos trabalhadores, não há efetiva participação e deliberação de trabalhadores nas principais decisões da empresa, além, é claro, do cidadão comum não ter qualquer possibilidade de ingerência no dia-a-dia de uma empresa privada.

Há outras razões para se questionar a juridicidade e constitucionalidade apontada por juristas, tanto no processo de aprovação da Lei quanto de mérito, mas seriam essas minhas contribuições iniciais sobre o tema.

Tarso Cabral Violin é Advogado, Pós-Doutor em Direito do Estado pela USP, Mestre e Doutor pela UFPR, Professor da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e Membro de Comissões na OAB-SP e OAB-PR.

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