A “Reforma Administrativa” de Bolsonaro

Presidente Jair Bolsonaro (PSL). Foto de Evaristo Sá (AFP)

É natural que todo novo governo federal escolha como será organizada a Administração Pública de sua esfera, no caso, a federal, principalmente sobre quais serão os Ministérios existentes na Administração Pública federal direta. Isso se chama “Organização Administrativa”, uma parte do estudo do Direito Administrativo. Normalmente o presidente empossado edita uma Medida Provisória sobre o tema, que depois é convertida em lei pelo Congresso Nacional.

Fazendo um histórico dos presidentes empossados pós-Constituição de 1988, o presidente Fernando Collor de Mello (PRN) sancionou a Lei 8.028/90 (conversão da Medida Provisória 150/90), que dispunha sobre a organização da Presidência da República.

Com o impeachment de Collor, assumiu seu vice, o presidente Itamar Franco, que sancionou a Lei 8.490/92 (conversão da Medida Provisória 309/92), que dispunha sobre a organização da Presidência da República.

O presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) sancionou a Lei 9.649/98 (conversão da Medida Provisória 1.651-43/98, reedição da MP 931/95 e outras MPs reeditadas desde então).

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou a Lei 10.683/2003 (conversão da Medida Provisória 103/2003), que dispunha sobre a organização da Presidência da República de seu governo, norma aproveitada pelo governo da presidenta Dilma Rousseff (PT).

Com o impeachment de Dilma, o que para muitos juristas foi um golpe, assume o seu vice, o presidente Michel Temer (MDB), que sancionou a Lei 13.502/2017 (conversão da Medida Provisória 782/2017), que dispunha sobre a organização da Presidência da República.

Com o presidente Jair Bolsonaro (PSL) não foi diferente. Ele assinou a Medida Provisória 870 em 1º de janeiro de 2019, que “estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios”.

As medidas provisórias são atos do presidente da República, que podem ser editados em caso de relevância e urgência, com força de lei. Até a Emenda Constitucional 32/2001, elas podiam ser reeditadas livremente, a cada mês, mesmo sem aprovação pelo Congresso Nacional. Depois de 2001, as MPs perdem sua eficácia, desde a sua edição, se não forem convertidas em lei pelo Congresso Nacional, no prazo de 60 (sessenta) dias, prorrogável uma vez por igual período. Esse prazo será contado desde e publicação da MP, sendo suspendido durante os períodos de recesso do Congresso Nacional.

Alguns chamam a MP 870 de “reforma administrativa” do governo Bolsonaro, o que é um equívoco. Na verdade, do golpe civil-militar de 1964 para os dias atuais, as duas únicas reformas administrativas, de fato, que ocorreram, foram as implementadas pelo Decreto-Lei 200/67, assinado pelo primeiro presidente da ditadura Humberto de Alencar Castelo Branco, e depois a reforma implementada no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso nos anos 1990.

O DL 200/67 ainda hoje é vigente, com várias alterações, e trata da Administração Pública direta e indireta federal, inclusive das autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, com influência, inclusive, na Administração Pública dos estados e municípios.

A reforma administrativa no governo FHC se deu em decorrência do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado de 1995, do antigo Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE), sob influência do neoliberalismo-gerencial, e da Emenda Constitucional 19/98 e legislação esparsa. Basicamente a ideia foi implementar o Estado mínimo ou apenas regulador, com privatizações radicais, e uma Administração Pública gerencial, copiando procedimentos da iniciativa privada, com o discurso da eficiência e controle de resultados, o que acabou gerando uma precarização da Administração Pública e mais corrupção.

A MP 870 não chega a fazer uma reforma administrativa, mas apenas uma reorganização administrativa nos termos do que defende o novo governo.

Vamos esperar ela ser convertida em lei para fazer mais comentários sobre a norma, já que o texto da MP está sendo bem modificado pelo Congresso Nacional, por falta de apoio e aptidão política do governo Bolsonaro.

Tarso Cabral Violin – advogado, mestre e doutor pela UFPR, professor titular de Direito Administrativo, autor dos livros “Gestão de Serviços Públicos” e “Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise crítica”, é o autor do Blog do Tarso

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Lei 12.550, de 15 de dezembro de 2011, que autoriza a criação de empresa pública federal de saúde

Autoriza o Poder Executivo a criar a empresa pública denominada Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – EBSERH; acrescenta dispositivos ao Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal; e dá outras providências.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o  Fica o Poder Executivo autorizado a criar empresa pública unipessoal, na forma definida no inciso II do art. 5o do Decreto-Lei no 200, de 25 de fevereiro de 1967, e no art. 5o do Decreto-Lei no 900, de 29 de setembro de 1969, denominada Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – EBSERH, com personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio, vinculada ao Ministério da Educação, com prazo de duração indeterminado.

§ 1o  A EBSERH terá sede e foro em Brasília, Distrito Federal, e poderá manter escritórios, representações, dependências e filiais em outras unidades da Federação.

§ 2o  Fica a EBSERH autorizada a criar subsidiárias para o desenvolvimento de atividades inerentes ao seu objeto social, com as mesmas características estabelecidas no caput deste artigo, aplicando-se a essas subsidiárias o disposto nos arts. 2o a 8o, no caput e nos §§ 1o, 4o e 5o do art. 9o e, ainda, nos arts. 10 a 15 desta Lei.

Art. 2o  A EBSERH terá seu capital social integralmente sob a propriedade da União.

Parágrafo único.  A integralização do capital social será realizada com recursos oriundos de dotações consignadas no orçamento da União, bem como pela incorporação de qualquer espécie de bens e direitos suscetíveis de avaliação em dinheiro.

Art. 3o  A EBSERH terá por finalidade a prestação de serviços gratuitos de assistência médico-hospitalar, ambulatorial e de apoio diagnóstico e terapêutico à comunidade, assim como a prestação às instituições públicas federais de ensino ou instituições congêneres de serviços de apoio ao ensino, à pesquisa e à extensão, ao ensino-aprendizagem e à formação de pessoas no campo da saúde pública, observada, nos termos do art. 207 da Constituição Federal, a autonomia universitária.

§ 1o  As atividades de prestação de serviços de assistência à saúde de que trata o caput estarão inseridas integral e exclusivamente no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS.

§ 2o  No desenvolvimento de suas atividades de assistência à saúde, a EBSERH observará as orientações da Política Nacional de Saúde, de responsabilidade do Ministério da Saúde.

§ 3o  É assegurado à EBSERH o ressarcimento das despesas com o atendimento de consumidores e respectivos dependentes de planos privados de assistência à saúde, na forma estabelecida pelo art. 32 da Lei no 9.656, de 3 de junho de 1998, observados os valores de referência estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar.

Art. 4o  Compete à EBSERH:

I – administrar unidades hospitalares, bem como prestar serviços de assistência médico-hospitalar, ambulatorial e de apoio diagnóstico e terapêutico à comunidade, no âmbito do SUS;

II – prestar às instituições federais de ensino superior e a outras instituições congêneres serviços de apoio ao ensino, à pesquisa e à extensão, ao ensino-aprendizagem e à formação de pessoas no campo da saúde pública, mediante as condições que forem fixadas em seu estatuto social;

III – apoiar a execução de planos de ensino e pesquisa de instituições federais de ensino superior e de outras instituições congêneres, cuja vinculação com o campo da saúde pública ou com outros aspectos da sua atividade torne necessária essa cooperação, em especial na implementação das residências médica, multiprofissional e em área profissional da saúde, nas especialidades e regiões estratégicas para o SUS;

IV – prestar serviços de apoio à geração do conhecimento em pesquisas básicas, clínicas e aplicadas nos hospitais universitários federais e a outras instituições congêneres;

V – prestar serviços de apoio ao processo de gestão dos hospitais universitários e federais e a outras instituições congêneres, com implementação de sistema de gestão único com geração de indicadores quantitativos e qualitativos para o estabelecimento de metas; e

VI – exercer outras atividades inerentes às suas finalidades, nos termos do seu estatuto social.

Art. 5o  É dispensada a licitação para a contratação da EBSERH pela administração pública para realizar atividades relacionadas ao seu objeto social.

Art. 6o  A EBSERH, respeitado o princípio da autonomia universitária, poderá prestar os serviços relacionados às suas competências mediante contrato com as instituições federais de ensino ou instituições congêneres.

§ 1o  O contrato de que trata o caput estabelecerá, entre outras:

I – as obrigações dos signatários;

II – as metas de desempenho, indicadores e prazos de execução a serem observados pelas partes;

III – a respectiva sistemática de acompanhamento e avaliação, contendo critérios e parâmetros a serem aplicados; e

IV – a previsão de que a avaliação de resultados obtidos, no cumprimento de metas de desempenho e observância de prazos pelas unidades da EBSERH, será usada para o aprimoramento de pessoal e melhorias estratégicas na atuação perante a população e as instituições federais de ensino ou instituições congêneres, visando ao melhor aproveitamento dos recursos destinados à EBSERH.

§ 2o  Ao contrato firmado será dada ampla divulgação por intermédio dos sítios da EBSERH e da entidade contratante na internet.

§ 3o  Consideram-se instituições congêneres, para efeitos desta Lei, as instituições públicas que desenvolvam atividades de ensino e de pesquisa na área da saúde e que prestem serviços no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS.

Art. 7o  No âmbito dos contratos previstos no art. 6o, os servidores titulares de cargo efetivo em exercício na instituição federal de ensino ou instituição congênere que exerçam atividades relacionadas ao objeto da EBSERH poderão ser a ela cedidos para a realização de atividades de assistência à saúde e administrativas.

§ 1o  Ficam assegurados aos servidores referidos no caput os direitos e as vantagens a que façam jus no órgão ou entidade de origem.

§ 2o  A cessão de que trata o caput ocorrerá com ônus para o cessionário.

Art. 8o  Constituem recursos da EBSERH:

I – recursos oriundos de dotações consignadas no orçamento da União;

II – as receitas decorrentes:

a) da prestação de serviços compreendidos em seu objeto;

b) da alienação de bens e direitos;

c) das aplicações financeiras que realizar;

d) dos direitos patrimoniais, tais como aluguéis, foros, dividendos e bonificações; e

e) dos acordos e convênios que realizar com entidades nacionais e internacionais;

III – doações, legados, subvenções e outros recursos que lhe forem destinados por pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado; e

IV – rendas provenientes de outras fontes.

Parágrafo único.  O lucro líquido da EBSERH será reinvestido para atendimento do objeto social da empresa, excetuadas as parcelas decorrentes da reserva legal e da reserva para contingência.

Art. 9o  A EBSERH será administrada por um Conselho de Administração, com funções deliberativas, e por uma Diretoria Executiva e contará ainda com um Conselho Fiscal e um Conselho Consultivo.

§ 1o  O estatuto social da EBSERH definirá a composição, as atribuições e o funcionamento dos órgãos referidos no caput.

§ 2o  (VETADO).

§ 3o  (VETADO).

§ 4o  A atuação de membros da sociedade civil no Conselho Consultivo não será remunerada e será considerada como função relevante.

§ 5o  Ato do Poder Executivo aprovará o estatuto da EBSERH.

Art. 10.  O regime de pessoal permanente da EBSERH será o da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, e legislação complementar, condicionada a contratação à prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, observadas as normas específicas editadas pelo Conselho de Administração.

Parágrafo único.  Os editais de concursos públicos para o preenchimento de emprego no âmbito da EBSERH poderão estabelecer, como título, o cômputo do tempo de exercício em atividades correlatas às atribuições do respectivo emprego.

Art. 11.  Fica a EBSERH, para fins de sua implantação, autorizada a contratar, mediante processo seletivo simplificado, pessoal técnico e administrativo por tempo determinado.

§ 1o  Os contratos temporários de emprego de que trata o caput somente poderão ser celebrados durante os 2 (dois) anos subsequentes à constituição da EBSERH e, quando destinados ao cumprimento de contrato celebrado nos termos do art. 6o, nos primeiros 180 (cento e oitenta) dias de vigência dele.

§ 2o  Os contratos temporários de emprego de que trata o caput poderão ser prorrogados uma única vez, desde que a soma dos 2 (dois) períodos não ultrapasse 5 (cinco) anos.

Art. 12.  A EBSERH poderá celebrar contratos temporários de emprego com base nas alíneas a e b do § 2º do art. 443 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, mediante processo seletivo simplificado, observado o prazo máximo de duração estabelecido no seu art. 445.

Art. 13.  Ficam as instituições públicas federais de ensino e instituições congêneres autorizadas a ceder à EBSERH, no âmbito e durante a vigência do contrato de que trata o art. 6o, bens e direitos necessários à sua execução.

Parágrafo único.  Ao término do contrato, os bens serão devolvidos à instituição cedente.

Art. 14.  A EBSERH e suas subsidiárias estarão sujeitas à fiscalização dos órgãos de controle interno do Poder Executivo e ao controle externo exercido pelo Congresso Nacional, com auxílio do Tribunal de Contas da União.

Art. 15.  A EBSERH fica autorizada a patrocinar entidade fechada de previdência privada, nos termos da legislação vigente.

Parágrafo único.  O patrocínio de que trata o caput poderá ser feito mediante adesão a entidade fechada de previdência privada já existente.

Art. 16.  A partir da assinatura do contrato entre a EBSERH e a instituição de ensino superior, a EBSERH disporá de prazo de até 1 (um) ano para reativação de leitos e serviço inativos por falta de pessoal.

Art. 17.  Os Estados poderão autorizar a criação de empresas públicas de serviços hospitalares.

Art. 18.  O art. 47 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso V:

“Art. 47.  ……………………………………………………………

…………………………………………………………………………………

V – proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos.” (NR)

Art. 19.  O Título X da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte Capítulo V:

CAPÍTULO V

DAS FRAUDES EM CERTAMES DE INTERESSE PÚBLICO

Fraudes em certames de interesse público

‘Art. 311-A.  Utilizar ou divulgar, indevidamente, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de:

I – concurso público;

II – avaliação ou exame públicos;

III – processo seletivo para ingresso no ensino superior; ou

IV – exame ou processo seletivo previstos em lei:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

§ 1o  Nas mesmas penas incorre quem permite ou facilita, por qualquer meio, o acesso de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput.

§ 2o  Se da ação ou omissão resulta dano à administração pública:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

§ 3o  Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o fato é cometido por funcionário público.’ (NR)”

Art. 20.  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 15 de  dezembro  de 2011; 190o da Independência e 123o da República.

DILMA ROUSSEFF
Fernando Haddad
Alexandre rocha Santos Padilha
Miriam Belchior

Este texto não substitui o publicado no DOU de 16.12.2011