Bresser-Pereira, ex-ministro de FHC, assina manifesto dos juristas contra Impeachment de Dilma

Bresser-Pereira, FHC e a privatização da saúde

O economista e bacharel em Direito Luiz Carlos Bresser-Pereira, ex-ministro da Reforma do Aparelho do Estado do governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e ex-ministro da Fazenda do governo do ex-presidente José Sarney (PMDB), acabou de assinar o Manifesto Nacional dos Juristas contra o Impeachment ou Cassação da presidenta Dilma Rousseff (PT), que foi lançado na segunda-feira (7), já conta com quase 5 mil assinaturas de juristas, professores universitários de Direito, advogados, juízes, membros do Ministério Público, bacharéis e estudantes de Direito e cidadão que defendem a Democracia e são contrários ao golpe.

Luiz Carlos Bresser-Pereira é professor emérito da Fundação Getúlio Vargas onde ensina economia, teoria política e teoria social. É presidente do Centro de Economia Política e editor da Revista de Economia Política desde 1981. É bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo, mestre em administração de empresas pela Michigan State University, doutor e livre docente em economia pela Universidade de São Paulo.

Como forma de comprovar que o manifesto é plural a abraça todas as cores políticas e ideológicas, ele contou com a assinatura inaugural do maior jurista brasileiro do Direito Administrativo, Celso Antônio Bandeira de Mello, Professor Emérito de Direito Administrativo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, que foi um dos maiores críticos da Reforma Administrativa gerencial idealizada por Bresser-Pereira no governo FHC.

Já assinaram o manifesto juristas como Weida Zancaner, Lenio Luiz Streck, Agostinho Ramalho Marques Neto, Edésio Passos, Wilson Ramos Filho (Xixo), Carlos Frederico Marés de Souza Filho, Jacques Távora Alfonsin, Pedro Serrano, Aton Fon Filho, Paulo Abrão, Maurício Zockun, Luis Fernando Lopes Pereira, Vera Karam de Chueiri, Katya Kozicki, Tatyana Scheila Friedrich, Eneida Desiree Salgado, Sandro Lunard Nicoladeli, Ney José de Freitas, André Passos, Nasser Ahmad Allan, Claudio Ribeiro, Darci Frigo, Carol Proner, Gisele Cittadino, José Geraldo de Sousa Jr, Marcelo Semer e Salo de Carvalho, entre vários outros notáveis profissionais do Direito, estudantes e cidadãos.

Um dos idealizadores do documento, o advogado e professor de Direito Administrativo, Tarso Cabral Violin (autor do Blog do Tarso), comemorou a assinatura de Bresser: “em toda a minha vida acadêmica questionei jurídicamente a figura das Organizações Sociais idealizada pela reforma gerencial de Bresser. É uma satisfação vê-lo, ao lado de Celso Antônio Bandeira de Mello, na luta contra o golpe que querem aplicar contra a Democracia brasileira”.

Se você é advogado, professor universitário de Direito, bacharel ou estudante de Direito, ou mesmo quer apoiar a causa, pode assinar o manifesto aqui e ajudar a divulgar o documento.

O texto completo do manifesto é o seguinte:

MANIFESTO DOS JURISTAS CONTRA O IMPEACHMENT OU CASSAÇÃO DE DILMA

Pela construção de um Estado Democrático de Direito cada vez mais efetivo, sem rupturas autoritárias, independentemente de posições ideológicas, preferências partidárias, apoio ou não às políticas do governo federal, nós, juristas, advogados, professores universitários, bacharéis e estudantes de Direito, abaixo-assinados, declaramos apoio à continuidade do governo da presidenta Dilma Rousseff, até o final de seu mandato em 2018, por não haver qualquer fundamento jurídico para um Impeachment ou Cassação, e conclamamos todos os defensores e defensoras da República e da Democracia a fazerem o mesmo.

Brasil, dezembro de 2015

Para assinar o manifesto basta completar aqui com seu nome, e-mail e no comentário seu mini-currículo ou se é estudante de Direito.

Último texto de Bresser-Pereira na Folha. Agorá só no Twitter

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Na Folha de S. Paulo de hoje.

República e desenvolvimentismo

Luiz Carlos Bresser-Pereira

Novo desenvolvimentismo social é a melhor estratégia para alcançar a República, que é o objetivo de todos

A República somos nós; é a nação e o Estado brasileiro; é a solidariedade necessária entre todos os homens; é a esperança em um Estado mundial. A República representa os valores e os objetivos políticos que a humanidade construiu para si; é a segurança e a paz, é a liberdade individual que nos foi ensinada pelo liberalismo político, é o bem-estar econômico defendido pelo desenvolvimentismo, é a democracia e a justiça social propostas pelos socialistas; é a proteção da natureza e, mais amplamente, da “res publica”, defendida pelo republicanismo.

O novo desenvolvimentismo é a estratégia para promover o progresso ou o desenvolvimento, para alcançar aqueles grandes objetivos políticos definidos nos últimos 300 anos e para, assim, garantir direitos: os direitos civis, os direitos políticos, os direitos sociais e os direitos republicanos, estes definidos como o direito de cada cidadão de que o patrimônio público não seja capturado por interesses privados.

O principal instrumento que os homens têm para alcançar esses objetivos ou afirmar esses direitos é o Estado, ou seja, o sistema constitucional-legal e a organização que o garante. O segundo instrumento é a política, e o terceiro é o mercado.

Enquanto o Estado é a instituição maior de uma sociedade nacional, que coordena toda a vida social, o mercado é uma instituição regulada pelo Estado que é insubstituível quando se trata de coordenar um sistema econômico competitivo.

Na antiguidade o Estado era o instrumento da oligarquia militar e religiosa. A partir da Revolução Capitalista –a maior da humanidade desde o surgimento da agricultura e da formação das primeiras grandes civilizações– o Estado vem se tornando gradualmente democrático, fruto de muita luta. Desde então o mercado passou a complementar a coordenação do Estado.

O progresso ou o desenvolvimento sem adjetivos é um processo histórico que tem início quando a Revolução Industrial completa a revolução capitalista. A partir desse momento tem início o desenvolvimento econômico que abrirá espaço para a realização dos grandes objetivos que a humanidade definiu para si própria: segurança, liberdade individual, bem-estar econômico, justiça social e proteção do ambiente.

O desenvolvimento não nos é dado de presente. É fruto de construção social, que implica conflito e cooperação em sociedades de classes sociais. Implica luta de classes e possibilita coalizões entre elas.

A luta de classes almejava o socialismo, e não foi resolutiva. Já as coalizões de classe são hoje a forma de organização da sociedade através da qual a luta pelo desenvolvimento se dá. Ela se trava entre coalizões desenvolvimentistas formadas frouxamente por empresários, trabalhadores e burocracia pública, e coalizões liberais de capitalistas rentistas e financistas. A República é o objetivo de todos. Mas um novo desenvolvimentismo social sempre renovado é a melhor estratégia para alcançá-la.

Esta foi minha última coluna. Aproveitei-a para resumir os principais valores e crenças que me orientaram ao escrevê-la. Agradeço aos meus leitores, que me acompanharam durante esses anos, e à Folha, que a abrigou.

O ataque moralista da direita – Luiz Carlos Bresser-Pereira

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Hoje na Folha de S. Paulo

Durante o governo Dilma, a direita recuperou a voz, mas vazia, de condenação de todos os políticos

Nestes últimos meses vimos a direita recuperar o dom da palavra. Em 2002 ela se apavorara com a perspectiva da eleição de um presidente socialista. O medo foi tanto e contaminou de tal forma os mercados financeiros internacionais que levou o governo FHC a uma segunda crise de balanço de pagamentos.

O novo presidente, entretanto, logo afastou os medos dos ricos que então perceberam que não seriam expropriados. Pelo contrário, viram um governo procurando fazer um pacto político com os empresários industriais e que não hostilizava a coalizão política de grandes e médios rentistas e dos financistas.

Por outro lado, o novo governo de esquerda pareceu haver logrado retomar o crescimento econômico, ao mesmo tempo que adotava uma politica firme de distribuição de renda. Na verdade, beneficiava-se de um grande aumento nos preços das commodities exportadas pelo país, e da possibilidade (que aproveitou de forma equivocada) de apreciar a moeda nacional que se depreciara na crise de 2002.

Lula terminou seu governo com aprovação popular recorde, e com a direita brasileira sem discurso. Deixou, porém, para sua sucessora, a presidente Dilma, uma taxa de câmbio incrivelmente sobreapreciada, que, depois de haver roubado das empresas brasileiras o mercado externo, agora (desde 2011) negava-lhes acesso ao próprio mercado interno.

Sem surpresa, os resultados econômicos dos dois primeiros anos de governo foram decepcionantes. E, no seu segundo ano, foram combinados com o julgamento do mensalão pelo STF, transformado em grande evento político e midiático.

Com isto o governo se enfraqueceu, e a direita brasileira recuperou a voz. Mas uma voz vazia, liberal e moralista. Liberal porque pretende que a solução dos problemas é liberalizar os mercados ainda mais, não obstante os maus resultados que geraram. Moralista porque adotou um discurso de condenação moral de todos os políticos, tratando-os de forma desrespeitosa, ao mesmo tempo que continuava a apoiar em voz baixa os partidos de direita.

Quando, devido às manifestações de junho, os índices de aprovação da presidente caíram, a direita comemorou. Não percebeu que caíam também os índices de aprovação de todos os governadores. Nem se deu conta de que a presidente logo recuperaria parte do apoio perdido.

Quando o STF afinal garantiu a doze dos condenados do mensalão um novo julgamento de alguns pontos, essa direita novamente se indignou. Agora era a justiça que também era corrupta.

Quando o deputado José Genoino (condenado nesse processo porque era presidente do PT quando as irregularidades aconteceram) manifestou o quanto vinha sofrendo com tudo isso —ele que, de fato, sempre dedicou a sua vida ao país, e hoje é um homem pobre–, essa direita limitou-se a gritar que o Brasil era o reino da impunidade, em vez de perceber que o castigo que Genoino já teve foi provavelmente maior do que sua culpa.

Os países democráticos precisam de uma direita conservadora e de uma esquerda progressista. Mas cada uma deve ter um discurso que faça sentido, em vez do mero moralismo que a direita vem exibindo.

O mensalão, as elites e o povo – Luiz Carlos Bresser-Pereira

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Depois do fracasso da aventura neoliberal, as elites se prendem ao velho moralismo liberal

O fato político de 2012 foi o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do processo do mensalão e a condenação a longos anos de prisão de três líderes do Partido dos Trabalhadores com um currículo respeitável de contribuições ao país.

O que significou, afinal, esse julgamento? O início de uma nova era na luta contra a corrupção no Brasil, como afirmaram com tanta ênfase elites conservadoras, ou, antes, um momento em que essas elites lograram afinal impor uma derrota a um partido político que vem governando o país há dez anos com êxito?

Havia um fato inegável a alimentar o processo e suas consequências políticas. O malfeito, a compra de deputados e o uso indevido do dinheiro público existiram. Mas também é inegável que, em relação aos três principais líderes políticos condenados, não havia provas suficientes -provas que o direito penal brasileiro sempre exigiu para condenar. O STF foi obrigado a se valer de um princípio jurídico novo, o domínio do fato, para chegar às suas conclusões.

Se, de fato, o julgamento do mensalão representou grande avanço na luta pela moralidade pública, como se afirma, isso significará que a Justiça brasileira passará agora a condenar dirigentes políticos e empresariais cujos subordinados ou gerentes tenham se envolvido em corrupção. Acontecerá isso? Não creio.

Como explicar que esse julgamento tenha se constituído em um acontecimento midiático que o privou da serenidade pública necessária à justiça? Por que transformou seu relator em um possível candidato à Presidência (aquele, na oposição, com maior intenções de votos segundo o Datafolha)? E por que, não obstante sua repercussão pública, o Datafolha verificou que, se a eleição presidencial fosse hoje, tanto Dilma Rousseff quanto o ex-presidente Lula se elegeriam no primeiro turno?

Para responder a essas perguntas é preciso considerar que elites e povo têm visão diferente sobre a moralidade pública no capitalismo.

Enquanto classes dominantes adotam uma permanente retórica moralizante, pobres ou menos educados são mais realistas. Sabem que as sociedades modernas são dominadas pela mercadoria e pelo dinheiro.

Ou, em outras palavras, que o capitalismo é intrinsecamente uma forma de organização econômica onde a corrupção está em toda parte. O Datafolha nos ajuda novamente: para 76% dos brasileiros existe corrupção nas obras da Copa.

Hoje, depois do fracasso da aventura neoliberal no mundo, as elites, inclusive a classe média tradicional, estão desprovidas de qualquer projeto político digno desse nome e se prendem ao velho moralismo liberal.

Já os pobres, pragmáticos, votam em quem acreditam que defende seus interesses. Não acreditam que elites e o país se moralizarão, mas, valendo-se da democracia pela qual tanto lutaram, votam nos candidatos que lhes inspiram mais confiança.

Não concluo que a luta contra a corrupção seja inglória. Ela é necessária, e sabemos que quanto mais desenvolvido, igualitário e democrático for um país, mais altos serão seus padrões morais. Terem havido condenações no julgamento do mensalão representou avanço nessa direção, mas ele ficou prejudicado porque faltou serenidade para identificar crimes e estabelecer penas.

Ontem, na Folha de S. Paulo

Bresser-Pereira defende Hugo Chávez e a esquerda na Venezuela

Hoje na Folha de S. Paulo

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA

A luta de Chávez

Sua retórica dá a impressão de que ele vá implantar o socialismo, mas seus atos deixam claro que não

Se as liberdades e o sufrágio universal estão assegurados, a democracia, garantida, e os cidadãos não estão ameaçados de expropriação por políticos revolucionários, não há razão para cidadãos com espírito republicano votarem em candidatos que defendem interesses dos ricos.

Eles estarão agindo de acordo com princípios de justiça se escolherem candidatos razoavelmente competentes que estejam comprometidos com os interesses dos pobres.

Estas considerações podem ser relevantes para eleitores de classe média decidirem seu voto, mas o que decide eleições é o voto dos pobres, como acabamos de ver na reeleição de Hugo Chávez na Venezuela.

Sua nova vitória comprova que a Venezuela é uma democracia e que os pobres lograram votar de acordo com seus interesses. Mas mostra também que os venezuelanos de classe média que nele votaram não defenderam seus interesses oligárquicos, mas os da maioria. Agiram conforme o critério republicano.

Chávez não é um revolucionário, mas um reformador. Sua retórica relativa ao “socialismo bolivariano” dá a impressão de que está prestes a implantar o socialismo no país, mas seus atos deixam claro que não tem essa intenção nem esse poder.

Essa mesma retórica alimenta a oposição local e dos Estados Unidos -uma potência imperial que, desde que ele foi eleito pela primeira vez, procura desestabilizá-lo.

Mais importantes, porém, são suas ações de governo. Essas apresentaram resultados impressionantes.

A renda per capita, que em 1999 era de US$ 4.105, passou a US$ 10.810 em 2011; a pobreza extrema foi de 23,4% da população para apenas 8,8%; e o índice de desigualdade caiu de 55,4% em 1998 para 28%, em 2008, com Chávez.

A Venezuela é um país muito difícil de governar porque é pobre e heterogêneo. E os interesses em torno do petróleo são enormes.

Nesse quadro de dificuldades, Chávez vem representando de forma exemplar a luta de uma coalizão política desenvolvimentista formada por empresários (poucos), trabalhadores e burocracia pública contra uma coalizão liberal e dependente formada por capitalistas rentistas, financistas, e pelos interesses estrangeiros. A luta de um país pobre para realizar sua revolução nacional e capitalista e melhorar o padrão de vida de seu povo.

Nas últimas eleições, o establishment internacional voltou a apoiar o candidato da oposição. Mas o que tem sido a oposição “liberal” na Venezuela desde a Segunda Guerra?

Essencialmente, uma oligarquia corrupta que se alternou no poder por 50 anos em um simulacro de democracia; uma elite econômica que reduziu a política à partilha das rendas do petróleo entre seus membros; um governo de ricos que sempre se submeteu às recomendações de política econômica do Norte, e exibiu, entre 1950 e 1999, o mais baixo crescimento de PIB da América Latina.

O establishment internacional ainda não foi vencido, e a nação venezuelana não está consolidada. Chávez contou com a ajuda dos preços elevados do petróleo para realizar um governo desenvolvimentista e social. Não a terá sempre.

Mas as últimas eleições mostraram que o povo venezuelano construiu uma democracia melhor do que aquela que o nível de desenvolvimento do país deixaria prever.

E que esta democracia é o melhor antídoto contra a oligarquia interna e o neoliberalismo importado.

Olimpíada da democracia social – Luiz Carlos Bresser-Pereira

Hoje na Folha de S. Paulo

O show [de abertura] não foi tão belo e tão grandioso quanto o chinês, mas foi democrático e progressista

As Olimpíadas são uma manifestação esportiva e cultural universal, mas não me lembro de ter visto um show de abertura tão nacionalista, tão contemporâneo e politicamente tão progressista. Durante duas horas vimos os britânicos celebrarem de maneira bem-humorada seus grandes feitos econômicos, científicos, culturais e sociais.

Lá estava a velha Albion, tanto a agrícola e pastoril quanto a da Revolução Industrial, da ciência moderna e da descoberta da internet. Lá estava o Reino Unido da rainha Elisabeth 2ª e de Shakespeare, a Grã-Bretanha do rock, da cultura pop e dos Beatles, de James Bond e da Alice de Lewis Carroll, das histórias infantis e de Harry Potter, do cinema britânico, das “Carruagens de Fogo” e de Mr. Bean. Lá estavam uma sociedade multicultural e seu Estado do bem-estar social representado pelo National Health Service. E nenhum sinal do poderio britânico, de sua City e suas bombas.

O show não foi tão belo nem tão grandioso quanto o chinês, mas foi democrático e progressista. Foi um show político. Foi um show de uma sociedade democrática que acredita e vê o progresso acontecer. Algo que é difícil em um mundo que vive a ressaca dos 30 anos neoliberais -vive a longa recessão que a crise financeira de 2008 desencadeou.

Durante 30 anos, o Estado do bem-estar social enfrentou crise, foi ameaçado por uma coalizão política de rentistas, financistas e economistas neoliberais que nos diziam que, na era da globalização, não havia mais espaço para um Estado dessa natureza. Que “racional” era um Estado cujas normas limitar-se-iam a garantir a propriedade, os contratos e a moralidade pública; que defendesse os ricos, já que não faziam parte das suas preocupações a fraude ou o estelionato dos quais os anos neoliberais foram pródigos.

Entretanto, como incurável otimista que sou, sempre afirmei que o Estado do bem-estar social resistiria ao ataque neoliberal, porque era realizado em democracias, e, nelas, a vontade do povo vale -uma vontade que é a favor dos grandes serviços sociais universais que caracteriza essa forma de Estado. Vivemos no tempo da democracia social, e nele a tentativa reacionária de voltar ao século 19 -o tempo do Estado liberal- não faz sentido.

Agora, diante do grande show de abertura com que nossos amigos britânicos nos brindaram, vemos mais um confirmação dessas verdades. De repente, aparece diante de nós, em uma grande festa nacional e mundial, o National Health Service (correspondente ao nosso Sistema Único de Saúde) como um personagem principal. Como uma grande realização britânica, e como a encarnação do bem. O que, de fato, é.

Entre os direitos fundamentais que o homem moderno definiu e vem conquistando -os direitos à liberdade, ao bem-estar econômico, à justiça, à proteção do ambiente, e à educação- está o direito universal aos cuidados de saúde. Nenhum direito é mais universal do que esse. Enquanto, nos outros, podemos justificar alguma desigualdade, nada justifica a desigualdade no caso da saúde. Não há nenhuma razão para que os mais ricos, ou os mais poderosos, ou os mais interessados tenham melhores cuidados de saúde. Essa verdade simples da democracia social foi belamente reafirmada na abertura da Olimpíada.

Intelectuais abandonam o PSDB

Aliados históricos do PSDB no meio acadêmico não vão apoiar José Serra (PSDB) na eleição para prefeito de São Paulo. Luiz Carlos Bresser-Pereira (economista, ex-secretário de Montoro e ex-ministro de FHC), José Marcio Rêgo (professor de economia da PUCSP e FGV e fez manifesto em defesa de Serra em 2006), Claudia Costin (ex-ministra de FHC e ex-secretária de Alckmin) e Maria Hermínia Tavares de Oliveira (professora da USP que assinou manifesto pró-Serra em 2006) vão apoiar Fernando Haddad (PT) nas eleições de outubro, conforme informou a Folha de S. Paulo de domingo.

O Blog do Tarso já havia informado que Bresser-Pereira saiu do PSDB e anda  batendo no neoliberalismo, com arrependimento do que fez no governo FHC.

Os intelectuais já foram embora. Sobraram Aécio Neves para cuidar da política anti-drogas do partido, José Serra que é responsável pela segurança de bolinhas de papel, Geraldo Alckmin o relações públicas e Beto Richa o intelectual que vai cuidar do programa de capacitação para PMs insubordinados.

O economista e ex-tucano Bresser-Pereira defende retomada do controle da YPF pela Argentina

A Argentina tem razão

Luiz Carlos Bresser-Pereira

Hoje na Folha de S. Paulo

Não faz sentido deixar sob controle estrangeiro um setor estratégico para o desenvolvimento do país

A Argentina se colocou novamente sob a mira do Norte, do “bom senso” que emana de Washington e Nova York, e decidiu retomar o controle do Estado sobre a YPF, a grande empresa petroleira do país que estava sob o controle de uma empresa espanhola. O governo espanhol está indignado, a empresa protesta, ambos juram que tomarão medidas jurídicas para defender seus interesses. O “Wall Street Journal” afirma que “a decisão vai prejudicar ainda mais a reputação da Argentina junto aos investidores internacionais”. Mas, pergunto, o desenvolvimento da Argentina depende dos capitais internacionais, ou são os donos desses capitais que não se conformam quando um país defende seus interesses? E, no caso da indústria petroleira, é razoável que o Estado tenha o controle da principal empresa, ou deve deixar tudo sob o controle de multinacionais?

Em relação à segunda pergunta parece que hoje os países em desenvolvimento têm pouca dúvida.

Quase todos trataram de assumir esse controle; na América Latina, todos, exceto a Argentina.

Não faz sentido deixar sob controle de empresa estrangeira um setor estratégico para o desenvolvimento do país como é o petróleo, especialmente quando essa empresa, em vez de reinvestir seus lucros e aumentar a produção, os remetia para a matriz espanhola.

Além disso, já foi o tempo no qual, quando um país decidia nacionalizar a indústria do petróleo, acontecia o que aconteceu no Irã em 1957. O Reino Unido e a França imediatamente derrubaram o governo democrático que então havia no país e puseram no governo um xá que se pôs imediatamente a serviço das potências imperiais.

Mas o que vai acontecer com a Argentina devido à diminuição dos investimentos das empresas multinacionais? Não é isso um “mal maior”? É isso o que nos dizem todos os dias essas empresas, seus governos, seus economistas e seus jornalistas. Mas um país como a Argentina, que tem doença holandesa moderada (como a brasileira) não precisa, por definição, de capitais estrangeiros, ou seja, não precisa nem deve ter deficit em conta corrente; se tiver deficit é sinal que não neutralizou adequadamente a sobreapreciação crônica da moeda nacional que tem como uma das causas a doença holandesa.

A melhor prova do que estou afirmando é a China, que cresce com enormes superavits em conta corrente. Mas a Argentina é também um bom exemplo. Desde que, em 2002, depreciou o câmbio e reestruturou a dívida externa, teve superavits em conta corrente. E, graças a esses superavits, ou seja, a esse câmbio competitivo, cresceu muito mais que o Brasil. Enquanto, entre 2003 e 2011 o PIB brasileiro cresceu 41%, o PIB argentino cresceu 96%.

Os grandes interessados nos investimentos diretos em países em desenvolvimento são as próprias empresas multinacionais. São elas que capturam os mercados internos desses países sem oferecer em contrapartida seus próprios mercados internos. Para nós, investimentos de empresas multinacionais só interessam quando trazem tecnologia, e a repartem conosco. Não precisamos de seus capitais que, em vez de aumentarem os investimentos totais, apreciam a moeda local e aumentam o consumo. Interessariam se estivessem destinados à exportação, mas, como isso é raro, eles geralmente constituem apenas uma senhoriagem permanente sobre o mercado interno nacional.

O economista Bresser-Pereira, ex-tucano, detona o neoliberalismo

O ex-presidente FHC (1995-2002), que privatizou e precarizou a Administração Pública ao implantar o neoliberalismo no Brasil, e o atual governador do Estado do Paraná, Beto Richa (PSDB), que mesmo com o fim da onda neoliberal no Brasil implanta seus ideais no estado.

Hoje na Folha de S. Paulo

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA

O poder dos economistas

Interessa a eles ensinar que os sistemas são autorregulados e basta corrigir suas falhas

Desde os anos 1970 os dirigentes das instituições financeiras e os economistas viram seu poder político crescer, mas o mundo também viu um imenso aumento da instabilidade financeira.

Enquanto financistas ganhavam milhões e milhões, o prestígio e o poder dos economistas aumentava. Enquanto estes, muitos transformados em financistas, aumentavam seus ganhos, as crises financeiras se multiplicavam, e a renda de cada país se concentrava nos 2% mais ricos.

Podemos buscar várias explicações para isso, mas creio que o fato histórico novo que teve papel determinante nessa mudança foi a decisão do presidente Nixon em 1971 de suspender a conversão do dólar em ouro ou, mais especificamente, a conversão das reservas em dólares dos outros países em ouro, se seus dirigentes o solicitassem.

A partir desse momento, o dinheiro perdeu referência com a economia real; a criação, o fluxo e a destruição de moeda passaram a ocorrer com grande facilidade; o endividamento do setor privado saiu de controle e, na falta de uma verdadeira âncora para a economia, as crises financeiras se tornaram, além de mais frequentes, também mais profundas.

O poder dos financistas e dos economistas aumentou porque eles passaram a ter um papel estratégico: seriam os gestores desse novo quadro monetário-financeiro -da “financeirização” da economia mundial. Mas, passados 40 anos, verificamos que fracassaram.

Os financistas, porque se preocuparam apenas em ganhar mais dinheiro para eles e para os rentistas. Os economistas, porque construíram uma teoria matemática -a teoria econômica neoclássica- que “demonstrava” que os mercados eram autorregulados, de forma que não havia por que gerir as economias nacionais e a economia mundial. Os dois, porque, ao desregularem os mercados financeiros, estavam “desgerindo” a economia.

Dani Rodrik informou em artigo recente (publicado no “Valor”, 19.dez.2011) que um grupo de estudantes abandonou o curso de seu colega na Harvard University Greg Mankiw, protestando contra o fato de que “o curso propaga ideologia conservadora disfarçada de ciência econômica e ajuda a perpetuar a desigualdade social”.

Os alunos foram benignos com a teoria econômica ortodoxa: deviam ter acrescentado que ajuda também a aumentar a instabilidade financeira e causar baixo crescimento.

Rodrik defendeu o colega, argumentando com o seu “paradoxo da globalização”: que nos cursos os economistas neoclássicos ensinam uma teoria econômica sofisticada, onde as falhas de mercado são devidamente salientadas, mas, na hora de proporem políticas, adotam um liberalismo econômico simplista. Ele está enganado.

Essa teoria econômica matemática que se ensina nas grandes universidades, baseada nos pressupostos do “homo economicus” e das expectativas racionais e no modelo do equilíbrio geral é essencialmente falsa, porque usa o método hipotético-dedutivo e porque adota como critério de verdade a coerência lógica, não a conformidade com a realidade.

Mas não é uma teoria falsa por engano; o é por arrogância matemática que lhes dá monopólio sobre o saber e porque interessa aos economistas ensinar que os sistemas econômicos são autorregulados, bastando para isso corrigir suas pequenas falhas.

Dessa forma eles usam a teoria econômica neoclássica para justificar “cientificamente” o neoliberalismo -uma ideologia reacionária que durante 30 anos (1979-2008) promoveu o atraso e a desigualdade em todos os países que a aceitaram. E, ao mesmo tempo, dizem aos cidadãos desses países que fiquem calados, já que não dominam o “conhecimento” matemático e preciso.

Veja, ainda, o post Bresser-Pereira detona o PSDB

Bresser Pereira sai do PSDB por entender que o partido é de direita, assume que teve uma recaída neoliberal durante o Governo FHC, mas não assume que sua reforma administrativa gerencial foi neoliberal

Faz tempo que o transporte coletivo em Curitiba não funciona mais, com o trânsito totalmente parado nos horários de pico. Hoje estava no trânsito estático da cidade, indo para a Universidade Positivo, e li pasmo a entrevista com Luiz Carlos Bresser Pereira, abaixo transcrita. Fiquei de queixo caído! Nunca havia percebido tamanha sinceridade num entrevistado.

Bresser Pereira informa que saiu do PSDB por entender que o partido é de direita, assume que teve uma recaída neoliberal durante o Governo FHC, e que caiu no conto da globalização, pois “ninguém é de ferro”.

A única falha na entrevista é no momento em que não assume que sua reforma administrativa como Ministro do MARE do Governo FHC foi neoliberal. Diz que sua reforma gerencial era essencialmente para fortalecer o Estado social, o que não é verdade. Sobre o tema ver meu livro Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise crítica.

Bresser diz ainda que os ricos odeiam a democracia, que FHC nunca foi nacionalista e confessa que foi na reunião do Consenso de Washington. Também informa que apoiou várias privatizações de FHC, a não ser a do setor elétrico, por ser monopólio. E que no período que foi diretor do Pão de Açúcar perdeu as garras e seu caráter crítico.

Veja a entrevista completa: Continuar lendo

Bresser-Pereira, FHC e a privatização da saúde

Ex-Ministro do MARE Luiz Carlos Bresser-Pereira

Luiz Carlos Bresser-Pereira sempre disse que sua Reforma Administrativa proposta no Governo FHC, quando ele era Ministro da Reforma do Aparelho do Estado, não foi neoliberal.

Perry Anderson (Balanço do Neoliberalismo) informa que o neoliberalismo nasceu após a segunda guerra mundial, com Friedrich Hayek (O Caminho da Servidão), que desde então reuniu os inimigos do Estado do bem-estar social europeu e do New Deal estadunidense. Com a crise econômica dos anos 70 e os Governos Thatcher e Reagan no início dos anos 80 o neoliberalismo começou a ganhar espaço, com seus ideais contrários a igualdade, aos sindicatos e ao movimento operário em geral e dos gastos sociais do Estado e, consequentemente, dos impostos. para o neoliberalismo o Estado deve ser forte apenas para romper o poder dos sindicatos e manter o grande capital, o mercado, mas parco nas intervenções econômicas e sociais. Sobre o tema recomendo VIOLIN, Tarso Cabral. Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise crítica (Fórum, 2ª ed., 2010).

Se neoliberalismo é o movimento contrário ao Estado do Bem-Estar Social, que se fortaleceu no Brasil com os governos de Collor e FHC, e uma das características foi a diminuição do tamanho do Estado, com privatizações, entendo que sim, a reforma de Bresser/FHC foi neoliberal.

Fernando Henrique Cardoso

Uma das grandes  bandeiras da reforma neoliberal-gerencial brasileira foi a figura das Organizações Sociais  – OSs. Entidades privadas sem fins lucrativos (Terceiro Setor), qualificadas pelo Estado, que assumiriam serviços sociais como educação e saúde. Bresser chamou, a época, de publicização, mas na verdade o repasse de serviços sociais para as OSs nada mais é do que privatização.

Eis que no último domingo foi publicado na Folha de S. Paulo artigo de Bresser criticando as privatizações por meio de PPPs, quando serão repassadas para entidades privadas a responsabilidade pela construção e gestão de hospitais e escolas públicas, que eu também critico e, inclusive, entendo ser inconstitucional (Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise critica).

Das duas uma: ou se arrependeu e verificou que foi um erro sua política neoliberal, ou até hoje tenta se enganar acreditando  no caráter social de sua reforma, pois a década de 90 foi negra para o Brasil no quesito estruturação e organização do Estado e da Administração Pública.

Pelo menos o ex-Ministro está certo em sua crítica às PPPs na saúde!

Veja o artigo de Luiz Carlos Bresser-Pereira do último domingo dia 16 na Folha de S. Paulo:


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA

Privatização da saúde

 


Na saúde, o mercado não é bom alocador de recursos porque não garante a qualidade dos serviços


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